terça-feira, maio 29, 2007

A Prova Oral do Século



Jorge Silva Melo é Cineasta, actor, encenador, dramaturgo, co-fundador do teatro da Cornucópia, director dos Artistas Unidos, cronista – e viveu no século passado (embora viva ainda neste, claro, não trazemos espectros à Prova Oral: têm a mania de artistas e não dizem nada de jeito), tal como quase todos nós, a não ser que tenhamos menos de sete aninhos.

Viveu e viveu muito intensamente, vida essa da qual fez crónica, crónicas, muitas crónicas, seiscentas páginas delas no volume que edita agora pela Cotovia e ao qual chamou – caramba, ele há coincidências – Século Passado.

«E, pela leitura, atravesse-se o país desde os anos 50, o Portugal apertadinho, em que as revistas de cinema, com fotografias e resumos, eram o seu telescópio de menino para o mundo, enquanto comia uma bola-de-berlim da leitaria do Senhor Aires: Eu gostava de tudo, dos Hércules no São Jorge, de uns policiais alemães com o Peter van Eyck no Roma, do fantástico 'Guerra e paz' de King Vidor, gostava era do cinema, de comprar o bilhete, receber o programa, ouvir o gong e ali ficar, entre aventuras de piratas e dramas de amor, pensando que iria ser assim, desmesurada, a minha vida adulta e o grande amor

«É da homenagem a muitos seus contemporâneos que Jorge Silva Melo quer que as Memórias se façam; e nessa humildade de se encarar como mero figurante, o rapaz que assiste à vida lá do 2º balcão (nunca nos libertamos da adolescência, não é?), está uma das lições deste livro a todos os títulos comovente: a consciência de que há gestos inaugurais que são absorvidos pela época que os suscitou, e que essa injustiça do presente nos pode calhar a nós.»

Portugal apertadinho dos anos 50, onde quase nada havia e o pouco que havia cheirava ao mofo da censura – e o que escapava, um livro trazido clandestinamente de fora, uma viagem aos respiradouro exterior, um filme visto lá, tinha o sabor acrescido pela raridade. Estará a fartura dos dias de hoje a estragar-nos o paladar?; quero dizer: conseguirá esta geração saborear devidamente um cd, por exemplo, quando os tem todos à disposição, sem censuras (ou quase, que o pudor higiénico do politicamente correcto começa a galgar terreno), às vezes à mera distância de um clique pirata? (um amigo confidenciou-me que «já não oiço música porque estou muito ocupado a procurá-la na net e a fazer os downloads»). Que relação tem o cronista da memória com aquela nostalgia do género «no meu tempo é que era bom»?; como vê Jorge Silva Melo a avalanche cultural dos dias de hoje, onde o trigo e o joio são servidos no mesmo pacote – e que nem sempre a atenção do público parece treinada ou interessada em separar uma coisa da outra?; será esta uma geração come-tudo-o-que-lhe-dão?

Perguntas e comentários para o 800 25 33 33 e caixa do blogue, a partir das 19, com Fernando Alvim e Marta Macara.

11 comentários:

Anónimo disse...

Alvim pork e k no site da antena 3 n está disponivel o podcast do programa do POOOOOOOOOOOORTOOOOOOOO? ve la isso sera azia? sera censura?
parabens pelo excelente programa!

SD

PTiago disse...

www.faiskao.blogspot.com

Anónimo disse...

Nandinho,

Parabéns pelo texto e não podia concordar mais com o que dizes. Com os meus trinta (quase "e um") aninhos vejo esta geração de agora a não saber saborear o que quer que seja: um livro, um filme, um cd... uma conversa, enfim.
"No meu tempo" tudo era vivido com mais intensidade até porque qualquer coisa teria que ser conquistada: uma ida ao cinema, um disco em vinil, um concerto, um festival...
As facilidades de agora estão a banalizar as experiências que para mim foram mais do prazeres e que me construiram enquanto pessoa que sou. Tomara eu agora ter de voltar a conquistar e viver tudo novamente e com a mesma intensidade!
Continuem o alerta!
Bjs
Alice

Anónimo disse...

Porque não um programa sobre ideias de negócio do MAIS ALTO NÍVEL e da MAIS BAIXA ORTODOXIA como por exemplo o hiena.pt?

Rui disse...

O teatro, as artes, a cultura são motores de evolução cada vez mais perdidos, pelos numeros economicos deste país.

Anónimo disse...

Na verdade penso que á história do "no meu tempo é que era" é uma grande tanga! Lá porque estamos mais velhos não devemos desvalorizar o presente.Tudo não passa de uma questão de saudosismo exagerado e à fartura de ofertas de tudo e mais alguma coisa, basta acrescentar cultura e sabedora para distinguir o trio do joio, o que interessa do que é dispensável. E isso só se consegue depois de explorar, de ver, de ouvir, de ler o bom e o mau!
Blasfemo
http://blasfemo.blogs.sapo.pt/

Anónimo disse...

sabedoria e trigo...hehehe
Blasfemo

Pedro disse...

Cada vez mais sinto que o único modo de sentir a vida – no que diz respeito às relações com os que nos rodeiam - é através desse lugar de figurino lá no segundo balcão. Vivemos a correr, com uma pressa assanhada para não se sabe muito bem o quê. Desejamos três mundos, piscamos os olhos e já os temos na palma da mão. Não pensamos sequer em considerar para que é que os desejamos em primeiro lugar. Achamos que ficaríamos bem como senhores de três mundos e pronto, queremo-los só para nós.

Mas o pior de tudo nem é esta frivolidade absurda mas sim – acho – a consciência de que somos realmente fúteis para com a vida todas que nos rodeia. Admiro aqueles que vivem pela vida, pelas sensações, pelo contacto com os outros e por nada mais. Não sou com certeza um deles, e tão-pouco serei o único. É pena.

Anónimo disse...

Ora viva caros amigos,

De facto em relação ao passado acho que é pena se ter perdido o respeito e (alguns) bons costumes... Certo?!

Abraços e flores,

QuÊ FrÔ?!

Mohammed (De volta)

Vaz disse...

será possível que mesmo depois de demorarem 4 dias a fazer o programa do campeão depois de este erro actualizam os podcasts e esquecem-se do fcp é normal deveriam aprender a perder..

http://dei15.blogspot.com/

Anónimo disse...

Bom tema!! Cinema! :)
Aproveitando a presença dos vossos convidados, possso fazer uma pergunta??

- Estou no 11º ano e gostava de envergar para uma carreira no ramo do cinema. Imagem e produção são o meu maior interesse. Acha mesmo que esta área está sobre-carregada em Portugal? Há alguma escola no norte?

Parabéns pelo livro de 600 e tal páginas...
Obrigado! Diogo